quarta-feira, abril 20, 2005

Caminho

"Cada caminho é apenas um entre um milhão de caminhos. Portanto, você deve ter sempre em mente que um caminho não passa de um caminho. Se você achar que não o deve seguir, não precisa segui-lo, de modo algum. Um caminho é apenas um caminho. Não é uma afronta para você ou outros se o largar, se for isso que o seu coração lhe aconselha. Mas a sua decisão de continuar no caminho ou abandoná-lo deve ser livre de medo ou ambição. Eu lhe aviso: examine cada caminho com atenção e propósito. Experimente-o quantas vezes julgar necessário. Depois faça uma pergunta a você, e só a você. É a seguinte: esse caminho tem coração? Todos os caminhos são os mesmos. Não levam a lugar algum. Há caminhos que passam pelo mato, ou vão para dentro do mato ou sob o mato. A única pergunta é se esse caminho tem coração. Se tiver, o caminho é bom. Se não, não tem utilidade."
( Léo Buscaglia, em Vivendo, Amando & Aprendendo


Aprender com a experiência dos outros é menos penoso do que aprender com a própria. (....) (....)Estamos usando nosso cérebro de maneira excessivamente disciplinada, pensando só o que é preciso pensar, o que se nos permite pensar.
Nossa maior tragédia é não saber o que fazer com a vida.
Por causa e em nome de Deus é que se tem permitido e justificado tudo, principalmente o mais horrendo e cruel.

sentou-se por um instante. Estava cansadO, a cabeça latejando idéias desencontradas. A vizinha ouvia uma ópera italiana, dessas bem tristes, deprimentes mesmo. Ouvia-se agora um barítono sofrido e constante, interrompido às vezes por uma voz fina de súplica desolada. A música penetrava o seu mundo irretocável e elE se percebia levemente irritadO. "Ela deve ser só", pensou ele, com um quê de meio sorriso nos lábios."Muito só". Era sempre assim, às nove da noite, sem atrasos, ela colocava a tal ópera pra tocar, alto, alto... E ele imaginava uma mulher de meia-idade, expressão puída e retraída, talvez bem acomodada em uma poltrona macia. Quem sabe um gato no colo, uísque na mesa, mão no queixo, olhar perdido... Mas, e a ópera? "Deve remetê-la a um amor passado, desses bem impossíveis", refletiu fitando a parede fria que separava ambos os mundos. "Lá deve ser tudo preto-e-branco, como nesses filmes dos anos 50". Parou e riu. Pra si mesmo. Estava com fome, procurou na geladeira algo interessante. Nada. Só o leite que comprara de manhã cedo... "Sabia que o leite é o alimento mais consumido no mundo?", comentou consigo, de dentro da própria solidão. Olhou-se no espelho, mas não reconheceu aqueles olhos sem brilho, aquele aspecto de quem espera amanhecer dentro de si. Era o avesso do avesso do avesso do avesso, como disse Caetano. E ele, que adorava Caetano, surpreendeu-se cantarolando baixinho (em meio à ópera serenada): "Vou te fazer um pedido Tempo tempo tempo tempo Compositor de destinos Tambor de todos os ritmos Tempo tempo tempo tempo Entro num acordo contigo" Surpreendeu-se com uma vontade imensa de dançar, mas não teve coragem, a vontade ficou presa entre o suspiro e os passos desencontrados. Parou diante do quarto à meia-luz, com cara de criança que quer subir em árvore. Remexeu cuidadosamente nos papéis do trabalho, sem emoção. Odiava tudo aquilo. As pálpebras pesavam um pouco e o coração batia - tedioso, conformado, coração - apenas batia. Levou uma das mãos ao peito, como quem procura ainda aquele ruído descompassado e irracional que um dia conheceu, mas resistiu. Ignorou. E, aos poucos, sufocou... Acariciou de leve a colcha de retalhos que cobria a cama e dava ao quarto um aspecto trivial. Tentou como pôde esvaziar os pensamentos, deixar de lado as batidas compassadas e doloridas. Mas era fraco, pensou ao cabo de alguns minutos, como era fraco. Era tão fraco que não tinha medo, apenas faltavam-lhe as certezas. Travava-se longa batalha dentro de si, mas faltava-lhe discernimento para compreendê-la. E a triste ópera da vizinha deixou de tocar, sem que ele percebesse. Quando aguçou mais uma vez os ouvidos não mais estava lá. Eram assim constantemente os dias de sua vida. Imaginou-a recolhendo-se em pensamentos singelos, talvez remoendo o passado frívolo, algum passo mal dado, ou mal recebido... O gato daqui a pouco sairia pela cidade em busca de aventuras, para, mais tarde, quem sabe, contá-las silenciosamente a dona. "Mas que noite!", admirou-se, observando o céu límpido e convidativo e bocejou de leve, sentindo o sono apoderar-se dele. Percebia em si a opressão dos sonhos desfeitos pelo leve tremor dos lábios. Mas ele continuava, seguia adiante, sobrevivia. "Se isso, afinal, não é coragem, é o quê?" Antes de adormecer, pensou ainda mais uma vez no gato vagando pela noite imensa... "Gato de sorte", suspirou. "Gato sortudo", e dormiu.








E o Pierrot chora pelo amor da Colombina"- Los Hermanos
.........blah...
"Se o mundo é mesmo parecido com que vejo/ Prefiro acreditar no mundo do meu jeito/ E você estava esperando voar/ Mas como chegar até às nuvens com os pés no chão?" - Renato Russo
Dessa vez eu vou ao show dos Los Hermanos... Eu espero que dê pra comprar o ingresso ainda essa semana...
Acreditem se quiser, estava com lágrimas nos olhos quando acabei de ler o conto que segue abaixo... Clarice, pra variar... Sempre ela... Pensei em comentar alguma coisa, mas tá aí pra quem quiser conferir...
"A TENTAÇÃO" Clarice Lispector
Ela estava com soluço. E como se não bastasse a claridade das duas horas, ela era ruiva.
Na rua vazia as pedras vibravam de calor - a cabeça da menina flamejava. Sentada nos degraus de sua casa, ela suportava.
Ninguém na rua, só uma pessoa esperando inutilmente no ponto do bonde. E como se não bastasse seu olhar submisso e paciente, o soluço a interrompia de momento a momento, abalando o queixo que se apoiava conformado na mão. Que fazer de uma menina ruiva com soluço? Olhamo-nos sem palavras, desalento contra desalento. Na rua deserta nenhum sinal de bonde. Numa terra de morenos, ser ruivo era uma revolta involuntária. Que importava se num dia futuro sua marca ia fazê-la erguer insolente uma cabeça de mulher? Por enquanto ela estava sentada num degrau faiscante da porta, às duas horas. O que a salvava era uma bolsa velha de senhora, com alça partida. Segurava-a com um amor conjugal já habituado, apertando-a contra os joelhos.
Foi quando se aproximou a sua outra metade neste mundo, um irmão em Grajaú. A possibilidade de comunicação surgiu no ângulo quente da esquina acompanhando uma senhora, e encarnada na figura de um cão. Era um basset lindo e miserável, doce sob a sua fatalidade. Era um basset ruivo.
Lá vinha ele trotando, à frente da sua dona, arrastando o seu comprimento. Desprevenido, acostumado, cachorro.
A menina abriu os olhos pasmados. Suavemente avisado, o cachorro estacou diante dela. Sua língua vibrava. Ambos se olhavam.
Entre tantos seres que estão prontos para se tornarem donos de outro ser, lá estava a menina que viera ao mundo para ter aquele cachorro. Ele fremia suavemente, sem latir. Ela olhava-o sob os cabelos, fascinada, séria. Quanto tempo se passava? Um grande soluço sacudiu-a desafinado. Ele nem sequer tremeu. Também ela passou por cima do soluço e continuou a fitá-lo.
Os pêlos de ambos eram curtos, vermelhos. Que foi que se disseram? Não se sabe. Sabe-se apenas que se comunicaram rapidamente, pois não havia tempo. Sabe-se também que sem falar eles se pediam. Pediam-se, com urgência, com encabulamento, surpreendidos.
No meio de tanta vaga impossibilidade e de tanto sol, ali estava a solução para a criança vermelha. E no meio de tantas ruas a serem trotadas, de tantos cães maiores, de tantos esgotos secos - lá estava uma menina, como se fora carne de sua ruiva carne. Eles se fitavam profundos, entregues, ausentes do Grajaú. Mais um instante e o suspenso sonho se quebraria, cedendo talvez à gravidade com que se pediam.
Mas ambos eram comprometidos.
Ela com sua infância impossível, o centro da inocência que só se abriria quando ela fosse uma mulher. Ele, com sua natureza aprisionada.
A dona esperava impaciente sob o guarda-sol. O basset ruivo afinal despregou-se da menina e saiu sonâmbulo. Ela ficou espantada, com o acontecimento nas mãos, numa mudez que nem pai nem mãe compreenderiam. Acompanhou-o com olhos pretos que mal acreditavam, debruçada sobre a bolsa e os joelhos, até vê-lo dobrar a outra esquina.
Mas ele foi mais forte que ela. Nem uma só vez olhou para trás.
agora eu era o rei, era bedel e era também juiz. E pela minha lei, a gente era obrigado a ser feliz!" - Chico Buarque

é o ano da nostalgia..." Eu não agüento mais meus próprios pensamentos... Hoje dei uma de andarilho ... Primeiro encontrei o livro da Virgínia Wolf que eu tanto queria num sebo em frente à FNAC e comprei CDs raros muito baratinhos num outro sebo (: (tava escrito no encarte; CD promocional, venda proibida)... hahaha... : "Alguns ruídos e chiados encontrados nesse disco são intencionais e não representam defeitos de fabricação".
Cai o pano quase que instantaneamente A boneca ri de seu teatro ambivalente A boca seca de incertezas conformadas Não cala a dor que vem das duas mãos atadas.
Segue o palhaço - mesmo que inutilmente Olhos já cegos pelo escuro reticente Condena tarde as outras noites mal contadas Que de tão puras chegam a ser inocentadas.
O par ferfeito segue a cena inquietante Não mais se esquivam os negros olhos conflitantes E a platéia, ao fim do enredo, desolada Percebe a morte vil nas cartas já marcadas.


(14/02)
ai.... ai.... O dia de ontem rendeu esse poema e uma crise de insônia infernal... !!!


"Eu que tinha tudo, hoje estou mudo, estou mudado, à meia noite, à meia-luz, pensando... Daria tudo por um modo de esquecer... Eu queria tanto estar no escuro do meu quarto, à meia noite, à meia-luz, sonhando... Daria tudo por meu mundo e nada mais..." - Guilherme Arantes
Tento lutar contra um monte de sentimentos ao mesmo tempo... Mas, não consigo... E, ultimamente, tem sido difícil evitar... Queria tanto olhar pras coisas como se ainda fosse criança, como se por trás de tudo houvesse uma mão mágica, um pressuposto lógico ou alguma razão subjetiva ocultando maravilhas absurdas e inimagináveis... Queria tanto carregar comigo ainda aquela vida, aqueles tempos, aqueles olhos puros, aquilo tudo... Não sei porque me bate às vezes essa melancolia, esse nó na garganta pelo que não vi, pelo que não vivi, pelo que não fui... Ou pelo que deveria ter sido... Talvez seja pelo que deveria estar sendo e não é... Será? Mas porque? Porque será que não consigo mais olhar nos olhos, encarar de frente aquilo que sempre quis evitar e que agora me sufoca, me ilude, me destrói... Sim, destrói pela incerteza das palavras, que machucam os sentidos e tornam aqueles momentos que poderiam ter sido apenas tolas hipóteses frustradas, insanas, irreais... Palavras tornam tudo tão plausível, tão medível, tão cabível... Como medir minhas palavras? Como batizar meus sentimentos??? Sei que tola sou eu por não arriscar... Mas não quero arriscar algo tão puro por um impulso inexplicável e egoísta... Não tenho esse direito... O jeito é fechar os olhos e esperar que tudo passe... Mas como impedir a água de seguir seu fluxo?
blah... acho que vou dormir....
Daquilo que eu sei Ivan Lins
Nem tudo me deu clareza Nem tudo foi permitido Nem tudo me deu certeza
Daquilo que eu sei Nem tudo foi proibido Nem tudo me foi possível Nem tudo foi concebido
Não fechei os olhos Não tapei os ouvidos Cheirei, toquei, provei Ah! Eu usei todos os sentidos Só não lavei as mãos E, por isso que eu me sinto Cada vez mais limpo
(... será que algum dia eu vou me sentir assim, como na música??)


"Abri a mão em cima da gravura com tachas na parede. Havia uma rosa de Van Gogh que tinha a mesma cor da minha mão. Rosas num pote verde. Tão inocentes, não? Um pote verde com rosas. Contudo, bastava olhar mais demoradamente para surgir a primeira dúvida: eram rosas vermelhas? Brancas? Amarelas? Todas as cores se empastavam nas pétalas entumescidas e que desabrochavam em labirintos escalavrados pelo pincel na ânsia de encontrar uma saída. Em vão ele abrira talhos profundos na massa espessa das corolas, rodando pelos mesmos caminhos como um viajante perdido na mata. Havia esperança? A resposta vinha do sangue que as pétalas gretadas iam vertendo: enquanto houver desespero, diziam elas, haverá luta. E na luta há salvação." - trecho retirado do livro "Verão no Aquário", de Lygia Fagundes Telles ...

como diria o próprio Picasso:" A arte é uma mentira que diz a verdade"....
... tenho umas coisas pra postar, mas tô com preguiça, então deixo a música aerials do system of adown que eu ouvi o dia todo hoje... É triste, mas é verdade... atualizei algumas coisinhas no blog: meu perfil (finalmente!) e coloquei alguns blogs e sites ótimos... Tribunal de Causas



"Disse ainda que tinha horror a planos, para mim... Não haveria nada depois. E mesmo que houvesse seria tão diferente do que se sonhou que acabaria uma decepção ver o sonho realizado." fragmento de "Verão no Aquário", de Lígya Fagundes Telles
Às vezes me pergunto porque tudo aconteceu tão de repente e porque ainda está acontecendo...
Acho que precisava mesmo desse tapa, desse baque; mas porque deixei que as coisas chegassem a esse extremo?
O medo da morte voltou com mais intensidade dessa vez...
Antigamente eu não me importava, sentia o medo embaralhar minhas certezas, mas o despezava...
Agora é diferente...
Sinto-o cada vez mais concreto em meus atos...
A morte também está lá, mãos dadas com minhas eternas incertezas...
Vejo-a, cada vez mais perto...
...mas não de mim...
E é isso que mais dói..........

Nenhum comentário: